Entrevita a Tiago Alves Costa, por José Nunes:
“(…) – José Nunes (JN): Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
– Tiago Alves Costa (TAC): Eu tento escrever todo os dias. Mas confesso não ter um plano prévio, nem para um livro individualmente, nem para os livros no seu conjunto. Escrevo muito instintivamente, às vezes com quatro ou cinco notas, quatro ou cinco ideias, uma ou duas imagens, e a partir daí começo a escrever algo que, muito sinceramente, não sei catalogar em termos de gênero. A escrita não tem hora marcada. Escrevo muito para investigar e portanto gosto de não saber o que vou fazer. Isso para mim é essencial, escrever sem saber o que vou fazer. Se tenho algum prazer na escrita será o da pura descoberta, ser surpreendido por esse novo mundo, esse território do espanto. Para mim uma fórmula não abre caminhos. A arte é uma constante des-regra.
– JN: Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
– TAC: Bastante caótico. Quando estou obcecado por uma ideia, um texto, escrevo como se não houvesse tempo, sem me submeter a qualquer tipo de horário. Sei, quase de forma intuitiva, que o texto já está escrito e só precisa de se converter em idioma, e esse é o meu trabalho. Direi que a fase que me dá mais prazer é quando se entra nesse etat second, esse estado hipnótico que nos impele como uma força poderosa para a escrita. A pesquisa passa sempre por esse trabalho inicial, esse jogo sedutor sem qualquer tipo de finalidade, que eu vou anotando aqui e ali para depois passar ao processo final, que consiste em passá-lo a formato digital. Reconheço que por vezes é difícil recomeçar no computador. Gosto muito desse processo primordial. A pesquisa no fundo está relacionada com a própria experiência, é um processo orgânico e vivo, uma escrita-vida, o meu bloco vai testemunhando como um electrocardiograma as minhas sensações diárias com o mundo.
– JN: Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
– TAC: É muito raro que me suceda o célebre pavor pela página em branco. Quando parto para esse suposto vazio da página já tenho alguma ideia ou nota prévia e não corro o risco de ficar a olhar a página. Mas as travas acontecem. Quando assim é, o melhor é deixar respirar o texto ou a ideia e voltar quando este pedir. Sinto muito prazer quando me encontro com um texto passado algum tempo, é nesse momento que sei se vale algo ou não, quando consigo ser o outro dos outros e ter esse pathos da distância sobre o texto. Confesso não ter medo de não corresponder as expectativas. Viver já é um exercício que nos exige muitos processos catárticos e de sobrevivência. Tento, dentro das suas dificuldades inerentes, desfrutar ao máximo da palavra. (…)”