Ao aghinaldo imos ao ghinaldo andamos, por Susana Sánchez Arins

ArtigoSusana Sánchez Arins de Susana Sánchez Arins na Plataforma de crítica literaria A Sega:
“(…) Foi uma enorme surpresa quando, uma tarde de novembro ou dezembro, não lembro, Pablo veu buscar-nos à casa. Combinara no teleclu com Virucha e Carmem da Quenlha. O teleclu do Fojo era uma casinha com paredes de papel que naqueles tempos malarranjaramos para ter como local próprio e juvenil. Ensaiavam vários grupos musicais e a estética do espaço era do tipo casa okupada: móveis resgatados dos faiados e das palheiras, asseio básico, cartões de ovos nas paredes e cheiro a tabaco. Para as línguas marmuradoras, espaço de vício e perdição. Por isso, que Virucha e Carmem foram ao teleclu era uma surpresa. E mais surpresa foi saber a razão: iam aprender-nos uns cantos de reis.
Se no Fojo ninguém sabia cantar… (…)
A gravação foi divertida (ainda existe o CD que o corrobora) porém o melhor foi a festa. Porque o 5 de janeiro de 2001 lá nos juntamos todas para cantarmos os reis polas casas do Fojo e polas da volta. Começamos na de Virucha, que não dava creto ao que escuitava e via: gente moça celebrando os reis passados mais de 50 anos. Não se animou a acompanhar-nos, mas sim Carmem, que foi a segunda a quem lhe pedimos o aguinaldo, castanhas, chouriços, fabas e torresmos. E assim como para nós foram inesperadas cantadoras Carmem e Virucha, nas casas do lugar foi grande a surpresa do chamado noturno. Nalguma acirraram os cães pensando-nos ladras (também o faziam quando corriamos o entroido). Em muitas abriam as portas amedonhadas para depois convidar a passar, e lamentavam não saber da visita para ter preparado um biscoito, uma rosca, o aguinaldo. Porque em todas as cozinhas, de súbito, emergia a memória daquelas noites de reices arrombadas em faiados e palheiras, como os móveis do teleclu, para serem substituidas por programação televisiva especial.
Para nós cantaram Carmem e Virucha, mais antes o figeram, em fevereiro de 1981, para Dorothé Schubarth, Cecilia, de 71 anos e outra Carme, de 67. Eram do lugar de Fontenlo, em Codeseda, e cantarom o Caminito, tal qual o aprendemos nós. Também o cantou em Calhobre e fragmentado, Mercedes, que em 1979 tinha 79 anos, é dizer, era vinte anos mais nova que Carmem da Quenlha. E no Cancioneiro de Dorothé aprendo que o nosso Caminito não é outra cousa que um canto sobre um dos temas do ciclo natalício, a fugida a Egito da Virgem, José e o Meninho, e dentro deste, o encontro com o cego. A que nós chamavamos Los pajarillos é uma versão, que não encontro literal no Cancioneiro, do nascimento de Jesus. Parece-me diferente das que recolheu Dorothé porque variam as assonâncias. (…)”