“Sombra de mulheres na erva”, por Susana Sánchez Arins

Artigo de Susana Sánchez Arins na Sega:
“(…) Esta é a arte de Daniel Asorey. Brinca com a verdade e a mentira com a finalidade única de atirar-nos dos olhos a venda que nos cega, a mesma que nos impede ver quem fomos e, portanto, que somos. E boa falta fazia, que alguém colocasse no papel, bem clarinho, o nosso lugar nessa história que sempre preferimos não ler.
O autor introduz-nos no seu mundo à maneira documental, mostrando as provas da verdade: a existência das cangaceiras. Nascemos ao romance com uma fotografia, tão brutal como real, das cabeças cortadas, sem ilhas nem piratas. E, pensando que estamos a ler recriação historicista, passa a situar-nos numa Compostela amsterdiana, substituídos por canles os caminhos de pedra que conhecemos. Falsidade. Como vão chegar as dornas à praça do Obradoiro!
E damos com elas. Com as protagonistas. Matilda a Gringa, Maria Bonita, Carme de Candingas. Eis as três. Com nome. E com capacidade de nomear o universo. Polos olhos e pensamentos delas, em espaços diversos, desde posições sociais diferentes, mesmo em distintos momentos históricos, vemos como aprendem que não são flores deste mundo, que o que elas vem, pretendem, querem, não pode ser edificado lá onde a história as colocou. Todas elas, as três, rebelam-se contra o seu destino de mulheres obedientes. Estão dispostas a luitar por mudá-lo todo, para, após o fulgor duma amarga descoberta, acabarem tão desiludidas como cientes de que as suas ambições de justiça excedem-se em ambiciosas. Não serão consentidas. (…)”