Entrevista a Susana Sánchez Arins na revista Palavra Comum:
“- Palavra Comum (PC): Que supõe para ti a literatura?
– Susana Sánchez Arins (SSA): Uma parte imprescindível de mim, de nós. Se não a tivesse, teria que inventá-la. Em realidade isso é o que levamos a fazer desde que somos humanas. Gosto dessa teoria a defender que a nossa área de Broca cerebral desenvolve a um tempo a capacidade linguística e a de manipular objetos com a mão direita. E aquela que associa sermos bípedas com o desenvolvimento do aparato fonador. Somos humanas porque fabulamos. Fabulamos porque somos humanas. E eu tenho-me por mui humana.
– PC: Como entendes o processo de criação artística?
– SSA: Pois sou mui materialista nesse assunto. Entendo-a como um processo de produção, um trabalho que manufatura objetos, artefactos. Em troca de utilizar como matéria prima o coiro, a madeira ou o papel, recorre ao coiro, à madeira ou ao papel, mas para outra cousa. No campo da literatura a matéria prima é a língua, a palavra, e o nosso trabalho consiste em repuxá-la, talhá-la ou tingi-la para expor a nossa maneira de ver o mundo, denunciar realidades que nos desgostam, propor alternativas de qualquer tipo, ou, simplesmente, jogar. Bom, talvez jogar seja o trabalho mais importante que devamos fazer com a palavra.
[Não gosto nada da palavra criação. Percebo-a com tal hálito de divindade, de superioridade, que para mim deriva em halitose. Achega-me à concepção da artista como a Elegida que vê onde as demais não vemos, o qual limita a acessibilidade à arte das pessoas não elegidas, que somos a maioria]. (…)
– PC: Que caminhos (estéticos, de comunicação das obras com a sociedade, etc.) estimas interessantes para a criação literária hoje -e para a cultura galega, em particular-?
– SSA: A nível estético penso que o caminho libertário é o melhor e é já um caminho aberto: penso que há grande diversidade de vozes e maneiras de fazer na literatura, independientemente da sua visibilidade. Se revisamos os títulos de poesia publicados no ano passado, por ponher um exemplo, resultaria-nos mui difícil, creio, estabelecer uma continuidade estética. Há de todo, como em botica, e isso é bom, porque assim todas podemos encontrar ligações com os nossos gostos e interesses.
Onde vejo eivas é no campo da visibilização, quer dizer, essa variedade que creio que sim existe, não é percebida pola comunidade leitora. Porque onde falhamos é na comunicação. E não só é um problema institucional (que também, com esse absoluto abandono da administração de bibliotecas e promoção livreira). As próprias escritoras temos hoje em dia uma cheia de recursos, antes inacessíveis (quem podia editar o seu próprio booktrailer e difundi-lo sem serem conhecidas numa canle de televisão?, p. e.), que não aproveitamos ao 100% para reduzir a distância com o nosso leitorado. (…)”