Entrevista a Adela Figueroa Panisse en Sermos Galiza:
“A escritora e ativista ecologista Adela Figueroa participou em Cabo Verde no IX Encontro de Escritores de Língua Portuguesa representando a Galiza e deu a palestra ‘A literatura infanto Juvenil na Galiza. Uma necessidade Cultural’ na que advogou pelo conto galego como ferramenta para a criação duma ligação com a cultura e língua nas crianças.
A edição do IX Encontro de Escritores de Língua Portuguesa decorreu do 20 ao 22 de junho na Cidade da Praia, Cabo Verde, sob o título ‘A literatura infantojuvenil’. Nele participou a escritora e ativista ecologista Adela Figueroa Panisse representando a Galiza ao ser Santiago membro da União de Cidades Capitais de Língua Portuguesa.
Adela Figueroa (…) advogou pelo conto galego como ferramenta para a criação duma ligação com a cultura e a língua nas crianças. Sermos Galiza conversa com a autora arredor da importância do conto no nosso país e o que significa a participação de escritoras galegas neste encontro internacional ao lado de autores e autoras da própria Galiza, de Cabo Verde, Angola, Guiné, São Tomé, Brasil e Portugal. Tanto Figueroa como a ilustradora galega Celsa Sánchez foram recebidas pelo presidente da República a quem obsequiaram o libro Galiza Cabo Verde, Abraço Poético, no que escrevem pessoas de ambos os dois países.
– Sermos Galiza (SG): Começou o seu relatório em Cabo Verde afirmando que somos “seres conta contos”. A que se refere?
– Adela Figueroa Panisse (AFP): Na cova de Eirós (Triacastela) encontrou-se os restos de uma fogueira de mais de 180.000 anos. Imagino as estóriase lendas que lá seriam contadas ao calor do lume por homens do Neanderthal e muitos milheiros de anos depois pelos chamados de Homo Sapiens sapiens (Cromagnon).
Os seres humanos necessitamos viver em sociedade e para manter esta é necessário normas de comportamento em comum. Também somos seres com sentido de transcendência que supera o que chamamos tempo presente. Por isso precisamos sabermos a história da tribo, e imaginarmos o futuro. A previdência é a faculdade de elaborar estratégias sobre situações possíveis, imaginadas. Os contos ajudam nessa função. Ainda, há muitos perigos lá fora. As crianças têm de apreenderem a superarem essas ameaças, e necessitam saber tudo acerca da natureza que nos fornece de alimento, perigos e segurança. Os contos tratam disso. Aprendemos brincando e escutando.
– SG: Na sua palestra fez referência à falta, há anos, de difusão de contos tradicionais galegos, o que obrigava a recorrer daquela a contos originários doutras culturas e noutros idiomas. Considera que hoje o conto tradicional galego está recuperado e goza de difusão?
– AFP: A transmissão cultural mudou. De ser feita ao pé da lareira para as escolas e através de outros meios como TV, radio, etc. Mas, na Galiza, existem muitas ações que favorecem a cultura oral. Temos em Lugo, por exemplo, a Galicia Encantada que coordena António Reigosa e que organiza um congresso todos os anos de cultura oral. Na Eira da Xoana (Fundación Eira, Ramil, Agolada) realizam-se atividades de conta contos tradicionais relativas às diferentes etapas do ano, por citar apenas um par de exemplos, mas há muitos mais casos.
Literatura escrita agora há muita, mas do ponto de vista histórico este fenómeno é recente. Por isso eu referia que os contos que me liam de criança não eram contos galegos. Mas eu sim que escutei contos tradicionais galegos. Hoje a literatura infanto juvenil em galego tem importância. Há muito publicado. Não tanto difundido. Eu nisto coloco muita responsabilidade nas escolas para alem das famílias. Falei com muitas pessoas (mestras e livreiras) para fazer a minha palestra e, em geral, podemos concluir que o papel das mestras é muito importante puxando pelos livros escritos em galego. Na falta duma verdadeira política de promoção do galego estas têm a responsabilidade de fomentar o idioma e favorecer a leitura em galego. Pelo que diz a respeito da vitalidade da nossa língua esta está em declive. Mas temos que falarmos de direitos linguísticos, direitos do povo e não somente de direitos particulares.
É a nossa comunidade galega quem tem a responsabilidade de conservar, praticar, defender e não perder o património comum que representa a língua. A primeira a ser escrita na península ibérica independente do latim, e que viajou polo mundo da mão de Portugal para ser hoje falada por mais de 200.000.000 de pessoas no mundo. Mas, ainda que só falássemos nós, temos a obriga de defende-la, porque é a nossa. Foi-nos entregue por milheiros de pessoas que a guardaram para nós, cultivando-a e crescendo-a. Seria traição deixá-la ir. Cito, na minha palestra as Escolas Semente que tanto fazem pela normalização da nossa língua: o galego. (…)”