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Antom Fortes Torres: “A arte foi um flutuador que não me falhou nunca”
Entrevista de Tiago Alves Costa a Antom Fortes Torres no Portal Galego da Língua:
“Entrevistamos Antom Fortes Torres (Sárria, 1957) que vem de publicar pela primeira na Através Editora dois livros de poesia que perfazem um só. Em Gris Cinza / Barbarie, Crisântemos e um Urbano Lugrís o poeta traz-nos uma proposta com uma forte componente sociopolítica, envolvida muitas vezes num pessimismo que conforma um universo de palavras que não querem operar de acordo com os trâmites do conforto. Apesar de serem dois livros com distintas texturas, desvela-se ao longo de toda a obra uma voz singular de um poeta comprometido, que dialoga com as vicissitudes da contemporaneidade tentando extrair o silêncio e repor o sentido às coisas. No fundo é a verdade colocada ao serviço de um mundo que parece ter desistido de si mesmo.
– Portal Galego da Língua (PGL): Antom, são dois poemários num só com dois títulos muito chamativos. Qual é genealogia do livro?
– Antom Fortes Torres (AFT): Gris Cinza é um texto do 2007. Coincide com um momento de crise íntima e social (económica). Então falava-se muito do genocídio nos Balcãs, e isso levou-me à primeira parte do livro: Uma reflexão sobre o ódio e os extermínios do s. XX. O demais é pessoal e ideológico. Quedou no caixão. Nessas datas comecei a escrever literatura dirigida ao âmbito juvenil, publicada por OQO Editora (Fume, Caderno de animalista, Á sombra dos anacardios…).
– PGL: Há claramente duas texturas distintas, uma mais relacionada com um processo catártico, onde se revela a perda, a morte inclusive. Logo entramos numa parte mais política, mais de vertente social. Podes aprofundar um pouco mais isto?
– AFT: barbárie, crisântemos e um Urbano Lugrís coincide com o luto pelas mortes dos meus pais (mui seguidas), com a jubilação, com o abandono da política… Tudo isto implica uma renovação, uma desconstrução, e te plantear em que direção tirar. Libertar-me dos legados foi uma tarefa árdua. A vertente sociopolítica está em todos os meus escritos; também nos livros eróticos (Figuras Masculinas de Meio-Corpo, Sexto Fetiche…). Estarmos alerta é imprescindível.
– PGL: “Salvas-me de todos os naufrágios, farol que guiavas o barco encalhado”. Sob a barbárie dos nossos dias, a poesia é uma fenda de luz, um último reduto de liberdade?
– AFT: Efetivamente. A poesia implica liberdade, às vezes supervivência; e para mim (a arte em geral) sempre foi um flutuador que não me falhou nunca.
Fico com a sensação que os dois poemários apesar de terem sido escritos em épocas distintas possuem linhas de força comuns e entroncam com a sociedade atual. A humanidade continua com os seus eternos problemas por resolver?
A linha de barbárie… é mais genérica, e o eu lírico mudou, mas os problemas são os mesmos. A perspectiva (poética) à hora de resolvê-los é outra, passou-se da ação potencial ao retiro. Quiçá os eternos problemas seguirão aí sempre. Eivas intrínsecas à espécie (humana).
– PGL: “Esquecimento atrás dos que latejam um murmúrio”. Consideras que a poesia, a arte, são cada vez mais uma linha de fuga à desmemória, um flagelo cada vez mais assaz das nossas sociedades?
– AFT: Não creio que a arte atual pretenda acabar com a desmemória. Delega-se nas Associações. Mas há poetas, entre os que me incluo, aos que o adjetivo “social” ou “comprometido” não lhes resulta alheio nem pejorativo; ainda que somos menos os críticos que os pós-modernos (Risos). (…)”