Entrevista de Teresa Crisanta Vasques Pilhado a Teresa Moure no Portal Galego da Língua:
“(…) – Portal Galego da Língua (PGL): Na apresentação pública do teu romance [Um elefante no armário] na Culturgal fizeste menção ao reto que para ti supus alcançar uma escrita menos barroquizante. Poderias precisar o alcance e objetivos desse propósito e ainda, trata-se dum desafio estritamente retórico ou tem dimensões compositivas, estruturais, etc.?
– Teresa Moure (TM): Um elefante no armário é um romance sobre a verdade. Ao fundo, as teorias deflacionistas que pretendem diminuir o peso desse conceito na ciência ou no pensamento, também na política. Porém, a protagonista, que é uma filósofa especializada nesse assunto, e que abandonou anos atrás toda atividade académica, deve regressar lá, à indagação, mas em contextos quotidianos, nas relações pessoais, na interpretação da própria vida. Essa temática obrigou-me a usar, especialmente nas partes narradas por Ana Brouwer, um estilo mais conciso, quase poético. O procedimento tem a ver com a procura da autenticidade porque a verdade é isso: revelar o que está oculto, com a intencionalidade única de o conhecer. Trata-se apenas duma questão de estilo. Na estrutura, o romance é complexo: tem seis partes que incluem seis pontos de vista e nenhuma das vozes narradoras está em possessão da Verdade com maiúsculas; quem ler deverá decidir qual é a versão dos factos correta. É mesmo um desafio.
– PGL: Do meu ponto de vista, acho que em Um elefante no armário podemos encontrar vários elementos de ficção muito semelhantes com sucessos que de facto são reais. Por outro lado, podemos ler no romance que a verosimilitude é uma qualidade que não predicamos da realidade, mas sim temos uma certa tendência a exigi-la na literatura. Podes ser que estejas a ficcionalizar elementos da realidade para ver até que ponto uma e outra –é dizer, ficção e realidade– se podem distinguir?
– TM: Sempre que publico um romance, observo que @s leitor@s pretendem encontrar lá elementos autobiográficos ou episódios realmente acontecidos. Porém, literatura é literatura. Histórias são histórias. Provavelmente escritores nadamos num caldo cultural que implica nem só conceitos, também episódios, mas nem agora nem nunca pretendi ficcionar nada real. Porém, respondendo a tua pergunta num sentido mais geral, a literatura é esse espaço onde o imaginado e o real se confundem. E, com efeito, a vida surpreende-nos com histórias muito mais esquisitas do que aquelas que aparecem nos romances. Como diria Maurício Almeida, um dos protagonistas de Um elefante no armário, Deus, como escritor, não passa do nível de amador. (…)
– PGL: A propósito da tua tradução dos poemas da Ana Brouwer em Chan da pólvora (Não tenho culpa de viver), como é que concebes a autoria?
– TM: Em Um elefante no armário incluem-se fragmentos dum livro de filosofia que Ana Brouwer escreve. Apanhei alguns desses fragmentos (demasiado toscos talvez para serem verdadeira poesia, demasiado poéticos para serem verdadeira filosofia), num poemário ainda inédito que intitulei O dia em que comprei mentiras por catálogo. Antón Lopo, da chancela Chan da pólvora, soube da sua existência e propus publicar oito deles, numa escolha pessoal de editor, nesse livrinho Não tenho culpa de viver. Isso permite que saiam ao mesmo tempo a minha obra e a obra de Ana Brouwer. É um jogo sobre autorias que se explica só. A criação nunca vem do nada nem é estritamente individual. Fazemos parte sempre dessa coral de textos que nos constroem como indivíduos e que constroem a cultura como artefacto coletivo que nos representa e que nos modela. (…)”